sexta-feira, 5 de setembro de 2008

Moçambique: Um Caso de Sucesso na Reconstrução Pós-Conflito

Por Isabelle Araujo

Em 1992, a guerra civil em Moçambique que já durava 16 anos – desde a independência do país em 1975 – chegou ao fim. Desde então, uma nova Constituição foi promulgada e com ela se estabeleceu um sistema político pluri-partidário, uma economia de mercado e eleições livres que, sem dúvida, foram fundamentais para a reconstrução política e estabilização institucional do país.
Nos últimos dez anos Moçambique cresceu em média 8%a.a., uma das maiores taxas de crescimento entre os países importadores de petróleo. Esse bom desempenho foi resultado de uma melhora nos setores de transporte, comunicação e construção civil, além do crescimento da produção agrícola. Segundo o Banco Mundial, foi crucial a implementação, durante o processo de reconstrução política e econômica, de reformas estruturais para o aumento do investimento externo direto nos setores de alumínio, gás natural e titânio.
Entre 1997 e 2003 a pobreza no país foi reduzida em 15%, o que significou a saída de 3 milhões de pessoas da condição de extrema pobreza. Dentre as principais mudanças ocorridas desde o fim da guerra civil em 1992, destacam-se: a liberalização comercial, o aumento expressivo na produção agrícola, a construção de uma atmosfera liberal para investimentos, a reforma do setor financeiro, a melhora na educação e saúde, a redução do custo dos transportes e o aumento da disponibilidade de recursos hídricos.
A liberalização comercial significou um crescimento de 20%a.a. nas exportações moçambicanas nos últimos 10 anos, fazendo de Moçambique um dos poucos países africanos que aumentaram sua parcela de participação no comércio internacional. O maior fluxo de comércio representa não só maiores rendas auferidas por meio da exportação, mas também uma queda no custo de vida da população que passa a ter acesso a uma variedade maior de produtos por menores preços. Aumenta também a possibilidade de introdução de novas tecnologias no país, fator importante no aumentar dos níveis gerais de produtividade da economia interna. Além disso, o capital internacional vê no país melhores oportunidades de estabelecer indústrias voltadas para a exportação.
Por outro lado, o crescimento da agricultura também foi fundamental, pois além de melhorar as condições de vida da população rural, diminuiu o preço dos alimentos no mercado interno e, com isso, possibilitou o aumento da renda real dos trabalhadores urbanos, oferecendo melhores condições para o estabelecimento de empresas estrangeiras no território moçambicano. O aumento de 5.6%a.a. em média na produção agrícola desde 1992 se deu de várias formas: por meio da expansão da área plantada, aumento da mão-de-obra e melhora nos níveis de produtividade por hectare plantado.
A economia interna, a medida que se torna mais complexa, facilita o empreendedorismo e fortalece o setor privado em relação ao setor público, conferindo maior previsibilidade e favorecendo atitudes voltadas ao investimento. Em paralelo a essas reformas, devem ser implementadas mudanças nas estruturas do Estado, para que tais avanços não encontrem, nos órgãos estatais, obstáculos para seu crescimento.
Na área de educação verificou-se um aumento no número de crianças matriculadas em escolas primárias. Também houve uma melhora nas condições de saúde da população, refletida principalmente numa queda em 35% nas taxas de mortalidade infantil desde 1990.
Existem, porém, vários desafios a serem enfrentados nessas duas áreas. O maior deles é a incidência de HIV/AIDS duas vezes maior que a média dos países africanos responsável por reduzir em 14 anos a expectativa de vida da população. A malária e a tuberculose também são grandes fatores de preocupação por serem as maiores causas do altos níveis de mortalidade infantil.
No período de conflito a infra-estrutura do país foi fortemente prejudicada. Ao investir na melhoria das condições das estradas do país, através principalmente da ajuda do Banco Mundial, o custo de investimos foi reduzido. As matérias-primas e a produção podem circular mais rápida e facilmente pelo país reduzindo sobremaneira as perdas com acidentes e aumentando o escoamento da produção, principalmente no setor exportador.
Uma grande preocupação do país, porém, é a eletricidade, que é apontada por 64% das empresas produtoras de manufaturados como o principal problema de infra-estrutura do país. Esse é um dos grandes desafios para o desenvolvimento de Moçambique, que ainda não está nem perto de ser equacionado.
Mesmo com todas essas mudanças e avanços, Moçambique ainda apresenta uma das piores performances nas pesquisas sobre eficiência nos negócios. Isso se deve principalmente a problemas do Estado, como corrupção e burocracia, e a problemas estruturais, como mercado de trabalho pouco flexível e infra-estrutura precária.
O capital privado internacional pode ajudar no financiamento desses empreendimentos. Com relação aos esforços internos de promoção de investimentos externos diretos no país, percebe-se que Moçambique está no passo certo, mas muito ainda há de ser feito. As reformas liberais empreendidas no país nos últimos 15 anos foram de fundamental importância para a sustentabilidade dos planos governamentais de desenvolvimento. Tais reformas permitem que o país continue usufruindo dos ganhos gerados pelo comércio internacional e se beneficie de investimentos externos, responsáveis por aumentar o nível de emprego, a produtividade geral da economia e a renda nacional.
É provável que tais avanços ajudem a África a sair de sua posição marginal, até mesmo esquecida, no comércio internacional e no mercado financeiro internacional. Como foi visto, muitas mudanças, principalmente políticas, ainda devem ser implementadas para que o mercado africano possa ser considerado uma fonte segura de investimentos.
A nova onda de investimentos externos para o continente africano poderá fazer com que os grandes tomadores de decisão na esfera pública internacional entendam que a África precisa de menos ajuda e mais incentivos. O caminho para o desenvolvimento dos países africanos está centrado na construção de suas plenas capacidades produtivas, buscando sempre soluções internas para os problemas do subdesenvolvimento.

Referências Bibliográficas

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